segunda-feira, 6 de abril de 2009

A ratoeira.

Um rato, olhando por um buraco da parede, vê um lavrador e a sua mulher a abrir um pacote. Pensou que tipo de comida poderia conter.
Ao ver sair do pacote uma ratoeira, correu ao pátio a avisar o resto da bicharada da quinta.
Foi ter com a galinha, que lhe respondeu que compreendia que aquilo podia ser um grande problema para o rato, mas para ela aquilo não a incomodava nada, que não a prejudicava.
A seguir foi ter com o porco, que lhe respondeu da mesma maneira, acrescentando que se lembraria do rato nas suas preces.
Por último, foi ter com a vaca, que ironizou “Uma ratoeira? Crê que estou em perigo?”.
O rato voltou à toca cabisbaixo e triste, por ninguém se importar verdadeiramente com ele, não conseguindo obter mais que umas preces do porco.
Naquela noite ouviu-se, de repente, o som da ratoeira em acção e a mulher do lavrador levantou-se, quase às escuras, para ver o que se passava. Mas quem tinha sido apanhado na ratoeira tinha sido uma cobra venenosa e não o rato. Na semi obscuridade, e não estando a mulher a contar com uma cobra em vez de um rato, a mulher foi picada pela cobra e teve que ser levada rapidamente para o hospital.
Quando voltou, estava com muita febre, o que recomendava uma canja de galinha; o agricultor pegou na sua faca afiada e foi providenciar o ingrediente principal…
Seguidamente, a mulher piorou, o que fez com que muitos amigos e familiares a viessem visitar; para dar comida a tanta gente, o lavrador matou o porco…
Como a mulher piorou ainda mais e acabou mesmo por morrer, veio muita gente ao funeral, pois esta era uma pessoa muito querida na terra; para alimentar ainda mais gente, o lavrador matou a vaca…
Isto para dizer que não há problemas que não nos dizem respeito, pois a verdade é que quando há uma ratoeira na casa toda a quinta corre risco; que no nosso país e no nosso planeta o problema de um, é o problema de todos. E que enquanto os políticos viram o povo um contra o outro, as classes umas contra as outras, as profissões umas contra as outras, os professores, os polícias, os juízes, os magistrados, os padres, os funcionários públicos, os médicos, os enfermeiros, os farmacêuticos, os notários, os estudantes, etc., uns contra os outros, para poderem prejudicar toda a gente e ninguém se importar (pois não é nada connosco), é importante que tomemos consciência que tudo o que é criar uma ratoeira para um é criar uma ratoeira para todos e não devemos dizer, com uma recalcada inveja dos outros e olhando só para o nosso umbigo, “que é bem feito”, pois a próxima ratoeira será posta para nós e a resposta dos outros será a mesma que a gente deu. E que temos que lutar todos juntos contra as ratoeiras que nos continuam a pôr todos os dias e acabar com o saque a que nos sujeitam constantemente para sustentar as clientelas políticas e temos que deixar de ter vergonha de dizer “NÃO!” .
Pois, como dizia o poeta russo Maiakovski (1893-1930) antes de ser assassinado após a revolução de Lenine:

Na primeira noite, eles aproximam-se
e colhem uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.

Na segunda noite, já não se escondem,
pisam as flores, matam o nosso cão.
E não dizemos nada.

Até que um dia, o mais frágil deles, entra
sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua,
e, conhecendo o nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.

E porque não dissemos nada,
já não podemos dizer nada.

Depois de Maiakovski houve aplicações às várias realidades…

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho o meu emprego
Também não me importei
Agora estão-me a levar
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
Bertold Brecht (1898-1956)


Um dia vieram e levaram meu vizinho que era judeu.
Como não sou judeu, não me incomodei.

No dia seguinte, vieram e levaram
meu outro vizinho que era comunista.
Como não sou comunista, não me incomodei.

No terceiro dia vieram e levaram meu vizinho católico.
Como não sou católico, não me incomodei.

No quarto dia, vieram e levaram-me;
já não havia mais ninguém para reclamar...
Martin Niemöller, 1933 - símbolo da resistência aos nazis.


Primeiro eles roubaram nos sinais, mas não fui eu a vítima,
Depois incendiaram os autocarros, mas eu não estava neles;
Depois fecharam ruas, onde não moro;
Fecharam então o portão da favela, que não habito;
Em seguida arrastaram até a morte uma criança, que não era meu filho...
Cláudio Humberto, 2007
Não podemos continuar de braços cruzados a assobiar para o lado, como se não fosse nada connosco. Temos que tomar as dores de morte dos outros como nossas.

1 comentário:

Rotiv disse...

Olá :)

Divulgação: Petição Contra a Venda das Antigas Torres de Radar

http://bloteigas.blogspot.com/2009/04/manteigas-peticao-contra-venda-das.html